sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Uma sombra passou por aqui*


A Vila, do diretor M. Night Shyamlan, não é um filme de horror, mas sim um estudo social com elementos de horror.

Se há uma cor capaz de descrever A Vila (The Village, EUA, 2004) essa cor é o vermelho. Um vermelho quase inexistente, proibido, que aparece vez ou outra como algum detalhe da paisagem, no sangue de um vestido branco, na frente de uma porta, entre os galhos nus da floresta e os ventos gelados e tenebrosos que ela traz consigo.
O quarto filme de M. Night Shyamlan, diretor indiano que começou com estrondoso sucesso em
O Sexto Sentido (1999), narra a história de uma garota ruiva, de olhos penentrantes, rosto jovem e corajoso. Seu nome é Ivy Walker. Ela vive em uma vila na Pensilvânia do século XIX, cercada pelas florestas de Convington. O lugar é pequeno, isolado e perdido no tempo. As árvores, com seus galhos despidos pelo sopro do outono, contam a história de misteriosas criaturas que vivem por lá. Atraídas pela cor vermelha, elas não atravessam a fronteira da vila, contanto que seus habitantes não adentrem a floresta.
Segredos são escondidos em cada canto do pequeno vilarejo. Conforme estranhos acontecimentos vão ocorrendo, a protagonista Ivy Walker se vê em uma situação na qual terá que cruzar a fronteira de sua vila e mergulhar nas sombras da floresta de Convington.
O elenco de estrelas composto pela belíssima Bryce Dallas Howard (filha do diretor Ron Howard), Joaquim Phoenix (o grande amor de Ivy), Adrian Brody (cuja inocência será fundamental para a trama), Sigourney Weaver, William Hurt e Brendan Gleeson (que escondem um segredo profundo e tenebroso) é o melhor já reunido pelo diretor. Em suas atuações, possuem tamanho entrosamento e sinceridade que é quase impossível imaginá-los fora de seus personagens.
A fotografia de Roger Deakins ressalta os tons dourados e avermelhados do filme, criando um ambiente caloroso e ao mesmo tempo assustador. Por vezes escuro e enigmático, o clima criado no filme é sombrio, e cada cor ressalta um aspecto importante da trama. A câmera se move como num sussurro, sempre espiando por detrás de uma parede ou porta, ou por cima do ombro do personagem principal.
A música, composta por James Newton Howard, flui como seda vermelha na pele de uma mulher. Orientada pelo violino da famosa Hilary Hahn, apresenta um tema feminino e delicado, que por vezes explode num trovão inquietante do espírito humano.
Algo vive em meio à floresta, certamente. Algo cruel e assustador. Conforme o vento sopra, a floresta nua chama com seu canto mau. Contudo, o verdadeiro horror vem de dentro das portas das casas construídas para os habitantes daquela vila. E é isso que Ivy irá descobrir ao cruzar a linha que separa seu mundo do desconhecido.
Há um fogo em seu coração, assim como no coração de cada habitante da comunidade. Contudo, aquilo que alimenta suas chamas difere de alma para alma. Seja por amor ou coragem, por ódio ou algo ainda mais escuro. Algo que alimenta o coração da floresta, e aqueles que não devem ser mencionados.
É o filme mais assustador de Shyamalan. É assustador em sua realidade. Uma fábula de como a dor e a violência nos seguem aonde quer que formos. E que existem lugares, assim como nas profundezas do coração humano, que são perdidos no tempo. Cercados e intocados por florestas sombrias e cantos sinistros, por onde as sombras passam.

*Título original pertence à coletânea do autor Ray Bradburry, The Illustrated Man, publicada no Brasil sob o título de Uma Sombra Passou Por Aqui.

"A Vila". Título original: "The Village". Ano: 2004 Nacionalidade: EUA Dirigido por: M.Night Shyamalan Roteiro de: M. Night Shyamalan Produzido por: Sam Mercer, Scott Rudin e M.Night Shyamalan Estrelando: Bryce Dallas Howard, Joaquim Phoenix, Sigourney Weaver, Adrian Brody, Brendan Gleeson e William Hurt. Música de: James Newton Howard Duração: 108 min. Resenha escrita por: Roberto F. F. Causo (para a faculdade Cásper Líbero). Nota: 9,5/10

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