domingo, 26 de junho de 2011

Cadillac sem motor





Carros 2, é muito bonito, muito divertido, mas não possui nenhuma das qualidades que o tornariam o que ele devia ser: um filme da Pixar.





Stephen King usou a expressão "Cadillac Sem Motor", para expressar seu sentimento com a adaptação de seu livro O Iluminado, realizada por Stanley Kubrick em 1980, que posteriormente viria a se tornar um clássico. O consagrado autor tinha lá suas razões, já que a megalomania realizada por quem muitos chamam de "gênio", não tinha NADA a ver com a história original de King. Jamais poderia imaginar que ela cairia tão perfeitamente - e gramaticalmente - quanto para o último filme dos estúdios Pixar.



Carros 2 (Cars 2, EUA, 2011), é a nova produção de um dos estúdios em maior evidência, e com histórico de maior sucesso da história de Hollywood. Juntos, os cineastas, roteiristas, compositores e técnicos já ganharam mais de uma dúzia de OSCARs, e elevaram o nível das animações para um novo patamar.



Nesta nova tentativa de despertar a mente e aquecer o coração dos espectadores, a história começa aproximadamente quatro anos após o término de Carros. Lightining McQueen (Owen Wilson) tornou-se uma espécie de Jimmie Johnson da Copa Pistão, vencendo quatro títulos consecutivos, e durante seu retorno a Radiator Springs, é compelido a participar de um campeonato mundial realizado por um bilionário que pretende promover o biocombustível inventado por ele. Tudo culpa de Mater (Larry The Cable Guy) que apronta as maiores confusões possíveis e imagináveis nesta sequência.



Durante a viagem dos dois à Tokyo, primeira de três baterias de provas que serão realizadas na Itália e Inglaterra, ambos não fazem a menor idéia do que estão para se meter: Finn McMissile é um agente secreto que possui a forma de um Aston Martin DB5 (carro icônico da série dos filmes de James Bond), está tentando desvendar uma conspiração envolvendo produtores de petróleo, o que aliás tem se tornado comum na filmografia americana. E de uma forma e de outras, acaba achando - coitado - que Mater é um agente norte-americano disfarçado, que está lá para ajudá-lo.



O que esta produção multimilionária apresenta, é uma completa torção da história original que fez relativo sucesso quando lançada alguns anos atrás. E o conceito é rasoavelmente interessante, ao colocar os personagens numa história do melhor estilo 007, mas neste caso é problemática, justamente pelo fato dos personagens não possuírem a maleabilidade necessária para os feitos requeridos pela história, que só poderiam ser - com relativo realismo - realizados por pessoas.



Durante a narrativa de 112 minutos (longa para uma animação), os problemas se acumulam. Começando pelo personagem Mater, que aqui ganha papel de protagonista. Alguém, em algum lugar, sabe-se lá por quê, disse ao diretor John Lasseter e ao grupo de roteiristas que ele era uma ideia muito bacana. Estavam errados. Como era coadjuvante no primeiro filme, ele não era um problema, mas ao assumir o papel de protagonista neste segundo filme, ele torna-se inacreditavelmente irritante, bobo, burro, sem graça e beirando o insuportável. O que demonstra claramente uma queda brusca no intelecto dos realizadores, que sempre foram capazes de providenciar um humor mais do que inteligente para um público composto tanto de crianças como adultos.



No fim, o melhor dos personagens, justamente McQueen, fica deixado de fora. E ele que havia demonstrado uma gigantesca evolução de caráter no primeiro filme, que raramente é vista no cinema contemporâneo com tanta sutileza, e que pareceu ser completamente esquecida aqui. Aliás, com quase nenhuma exceção, os personagens foram levados ao mais razo possível, o que também não condiz com o estilo Pixeriano de contar histórias.



A musica de Michael Giacchino é um caso interessante, e por dois motivos. Durante toda a sua carreira que começou lá atrás com Toy Story, John Lasseter trabalhou com o compositor Randy Newman. E tal parceria rendeu temas memoráveis como os do próprio Toy Story e Vida de Inseto. Tamanho o sucesso de suas composições, que as duas vitórias dentre as mais de vinte indicações de Newman ao OSCAR, foram justamente com canções compostas para filmes da PIXAR: Monstros S.A. e Toy Story 3. Correndo paralelamente, havia Michael Giaccino, que foi descoberto e consagrado em filmes da PIXAR: Os Incríveis, e a vitória do OSCAR, por UP, aliás, muito merecida. E de repente, ele se tornou o queridninho para compor as músicas das principais animações do estúdio, e de grandes produções cinematográficas. E sem pestanegar, Newman foi trocado por Giacchino. O resultado é uma das trilhas mais inexpressivas e sem vida tanto da carreira do compositor, como da história da PIXAR.



No geral, o humor é fraco e repetitivo, e os personagens rasos e desinteressantes, mas nem tudo são tragédias. O aspecto visual aqui, foi levado ao extremo da beleza e da complexidade, e a magnitude do design dos cenários e personagens deve ser amplamente admirado. Mas não é o suficiente para sustentar a obra como um todo.



Infelizmente, Carros 2, é um cadillac sem motor, muito bonito por fora e sem nada por dentro, que procura ser tudo aquilo que o público, agora mais exigente, quer ver: tem ação, romance, humor, e tudo o mais. O que os cineastas esquecerem, foi justamente de estabalecer as relações e as características fundamentalmente humanas, que fariam dele, o que ele deveria ter sido desde o princípio: um filme da PIXAR.



segunda-feira, 6 de junho de 2011

Qualquer semelhança com Avatar não é mera coincidência




Filmes como Dança com Lobos de Kevin Costner e Avatar de James Cameron, contam a história do confronto do homem com o mais exótico. E consequentemente, da descoberta da própria humanidade.

É bem possível que Dança com Lobos (Dances With Wolfs, EUA, 1990) tenha sido a redenção de Kevin Costner, tanto como ator, quanto como diretor. Em seu primeiro trabalho atrás das telas, ele logo de cara abocanhou 7 OSCAR, incluindo o de Melhor Direção e de Melhor Filme. Numa mistura do enigmático estilo impregnado por Clint Eastwood, com a brutalidade dos irmãos Coen, este é um típico filme de faroeste, onde os soldados americanos devem lutar contra os ferozes e temidos índios da região. Isso, é claro, se não fosse pelo protagonista.
O tenente Dunbar (Costner), começa o filme gravemente ferido no pé. Diante da possibilidade de perdê-lo, e de nunca mais andar normalmente, ele tenta suicídio, numa disparada insana contra um grupo de soldados inimigos durante a Guerra Civil. Sua tentativa fracassa, e ele é dado como herói. Cura-se do ferimento, e é destacado para montar uma guarda perto do território de uma curiosa tribo indígena. Logo ambos os lados começam suas primeiras tentativas de contato, e grande parte do filme narra a tentativa de ambos os lados de descobrirem um ao outro e se comunicarem.
Entretanto, isso obviamente seria mal visto pelo exército, já que os índios são inimigos ferrenhos das forças militares. Dunbar acaba se apaixonando por uma mulher branca que, desde pequena, é criada pelos índios. Isso lhe dá mais um motivo para ficar, e mais um motivo para seus antigos companheiros matarem-no. Logo um confronto se apresenta no horizonte, e o espectador sabe que ele terminará em violência.
Se isso parece com alguma outra coisa que você já viu, é por que parece mesmo. Filmes como Pocahontas da Disney, O Novo Mundo, de Terrence Malick (que aliás, são a mesma história), O Último Samurai de Edward Zwick e Avatar de James Cameron, todos retratam a mesma narrativa. O ocidental, que tem seu contato com uma tribo ou grupo exótico, e através desse contato, acaba se familiarizando, e tornando-se parte da cultura local, o que obviamente não é admitido pelas sociedades coloniais.
A lista que retrata a exploração colonial em países terceiro mundistas é ainda mais extensa, quando se pensamos em títulos como Apocalypse Now, adaptação do livro O Coração das Trevas de Joseph Conrad. Em todas essas histórias, a violência é utilizada como instrumento legal de domínio de um povo sobre outro. O que normalmente termina em barbárea.
Costner abandonada os retratos impressionistas utilizados por Conrad e Francis Ford Copolla em sua adaptação, e faz um retrato duro e cruel do que foi feito com os nativos americanos nos EUA, dos anos 1800. Mas assim como o ancestral mais antigo da literatura, Dunbar, assim como Marlow em O Coração das Trevas, se afasta paulatinamente da sua civilização, mergulhando em uma cultura totalmente nova. Assim como Jake Sully o fez em Avatar, e assim como Nathan Algren o fez em O Último Samurai.
Afinal, a descoberta da humanidade no mais estranho, mais exótico, mais alienígena, é a descoberta da própria humanidade. Tais histórias, mais do que críticas ao colonialismo imperial, são viajens de autodescobrimento.
Onde Costner de destaca, é por retratar a história de Dunbar de uma forma seca e cruel, desprovida de clichês e finais românticos. Sim, desde a primeira cena dos 181 minutos de Dança Com Lobos, sabemos como o filme vai acabar. Entretanto, durante cada um desses minutos, desejamos que por algum milagre divino, a situação mude, e os destinos se dirigam para algum lugar feliz.
Com um elenco que inclui Mary McDonnell e Graham Greene, em possivelmente suas melhores atuações - junto de Costner - Dança com Lobos é uma aventura épica da melhor qualidade, com uma fotografia soberba proporcionada por Dean Selmer e uma música envolvente composta por John Barry.
É uma pena, entretanto, que depois disso, o jovem galã americano tenha mergulhado de cabeça na arrogância e feito seus piores trabalhos - Waterworld, Wyatt Earp e O Mensageiro. Histórias interessantes senão tivessem sido trabalhadas com a megalomania crescente de Costner, na tentativa fracassada de repetir seu feito com esta obra.
Entretanto, ele tem tudo o que se orgulhar aqui. Pois essa é uma história que pode abranger os mais diferentes gêneros possíveis. Do Épico Western, ao Samurai, à Ficção Científica, Fantasia e afins. Afinal, o ato de descobrir o mais exótico, é o ato de descobrir a si mesmo.

domingo, 5 de junho de 2011

A vitória da Escuridão


Tudo parecia lindo e gracioso na nova adaptação para o cinema, dos quadrinhos da Marvel, X-Men. Até passados os primeiros cinco minutos.

Depois das duas últimas adaptações de um dos mais famosos - e melhores - histórias e quadrinhos de todos os tempos, os maiores fãs da série X-Men, pareciam que respirariam aliviados com a nova adaptação feita pelos estúdios Marvel, X-Men Primeira Classe (X-Men First Class, EUA, 2011), do diretor de Kick-Ass, Matthew Vaughn.
Tudo começa nos campos de concentração da Polônia, quando um garoto descobre poderes capazes de controlar metais, quando sua família é enviada para o campo de concentração. Parecido com a abertura do primeiro filme? Pois bem, a nova adaptação dos quadrinhos começa exatamente com a mesma cena do primeiro filme, até em termos de trilha sonora. O então jovem Erik Lehnsherr passa a se tornar uma experiência científica, nas mãos de uma espécie de "Médico-Monstro", interpretado por Kevin Bacon, que depois se revela o inimigo principal da turma dos X-Men, Sebastian Shaw.
O que o novo filme procura fazer, é simplesmente mostrar a origem de alguns dos personagens principais da saga, como o professor Xavier (James McAvoy) e Magneto (Michael Fassbender). Não é muito tempo depois da CIA descobrir a existência dos mutantes, com uma ajuda do próprio Xavier, que seu destino e o de Erik se cruzam, formando uma aliança para deter Sebastian Shaw, também um mutante, de iniciar a Terceira - e nuclear - Guerra Mundial, iniciando a Crise dos Mísseis de Cuba.
Eram poucas as coisas que podiam dar errado nesta super-produção. Um elenco fantástico, que inclui também Oliver Platt e Jennifer Lawrence (no papel de Mística), e 2 horas e 12 minutos para desenvolver uma boa história e os personagens.
Não foi o que aconteceu. Pois como qualquer super-produção que se preocupa mais em gastar seu babilônico orçamento em efeitos visuais do que num roteirista ou diretor decentes, X-Men Primeira Classe começa a declinar vertiginosamente ao término da primeira cena, que aliás, foi dirigida por Brian Singer.
Os efeitos especiais que esbanjam as telas são irrealistas e mal utilizados. Difícil de entender é a nova moda dos produtores de criarem explosões geradas por computador, tornando-as falsas e plastificadas, enquanto as indústrias de maquetes vão à falência.
Durante mais de duas horas de filme, o tempo é desperdiçado em constantes mal-coreografadas e mal-filmadas cenas de ação, do que no desenvolvimento dos próprios personagens, da história, ou mesmo dos péssimos usos de fotografia e edição, que impedem a contemplação de uma direção de arte expressiva.
A trilha sonora por Henry Jackman vai totalmente contra as obrigações de qualquer compositor de músicas para cinema. Tanto a trilha deste filme não o conduz, como não o eleva, sustentando-se na repetição constante de um tema musical pouco expressivo, que torna-se irritante depois de algum tempo.
O roteiro procura ser mais inteligente, mas acaba criando um grupo de personagens desinteressantes sem empatia ou química entre si, cujos dilemas de solidão, abandono e preconceito social, transmutam-se em algo raso e monocromático. A direção de Vaughn então, tampouco consegue extrair o melhor de seu maravilhoso elenco, como não consegue transpor os poucos momentos de profundidade que o roteiro lhe permite.
Fato é que estes novos X-Men, são tão inumanos quanto os protagonistas humanos, que aliás, morrem de maneira dispensável, como água pingando da torneira durante o filme inteiro. O que Brian Singer e Christopher Nolan conseguiram fazer em suas adaptações dos X-Men e do Batman, foi tornar seus personagens humanos. Quando eles são desprovidos de humanidade, suas tristezas, conquistas ou dilemas tornam-se não apenas desinteressantes, como pouco importantes.
O novo X-Men é um filme frio, que, embora esteja predestinado a fazer mais sucesso do que a outra adaptação da Marvel, Thor, carece de simpatia ou charme como seu companheiro nórdico esbanja. E se em relação às suas duas adaptações anterioras, X-Men o Confronto Final e X-Men Origens: Wolverine, Primeira Classe seja claramente uma evolução, ser comparado a obras tão ridiculamente asquerosas, não é sinal de elogio.
O filme sequer tem a decência de prestar atenção a detalhes óbvios e conhecidos de qualquer fã da série, criando relações interpessoais inexistentes nas histórias originais, e assim como o grande George Lucas fez com sua obra prima, Star Wars, criando situações inconsistentes com os próprios filmes da série.
Como a maioria das prequências que estão sendo lançadas no cinema, X-Men Primeira Classe, termina em tristeza. George Lucas o fez, ao narrar a trajetória de corrupção de Anakin Skywalker, para seu superego, Darth Vader. Aqui, o mesmo acontece, só que desta vez com Erik Lehnsherr e seu superego, Magneto. Afinal, quando se é abandonado e odiado pela sociedade, ceder para o lado da escuridão fica muito mais fácil.