sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Uma analogia ao tempo


No novo filme do diretor M. Night Shyamalan, o maior problema e a maior conquista vêm do tempo.

Depois de dois fracassos de bilheteria e público, com Fim dos Tempos e A Dama na Água, ao final de 2008, o diretor/roteirista indiano, M. Night Shyamalan assumiu a difícil tarefa de adaptar para os cinemas o sucesso do canal Nickelodeon, Avatar a Lenda de Aang (título brasileiro), criada por Michael Dante DiMartino e Bryan Konietzko.
Em um universo fantástico, as nações do ar, água, terra e fogo viviam em harmonia até que a nação do fogo entrou em guerra com as demais, com o intúito de escravizá-las. O então Avatar, um menino chamado Aang, capaz de controlar os quatro elementos, desaparece por 100 anos, até que é redescoberto por dois irmãos, Katara (interpretada por Nicola Peltz) e Sokka (interpretado pelo astro da saga Crepúsculo, Jackson Rathbourne
), que o leva a uma jornada para reestabelecer o equilíbrio entre as quatro nações.
É com essa proposta que Shyamalan apresenta O Último Mestre do Ar (The Last Airbender, 2010). De cara este material apresenta uma dificuldade com a qual o diretor
não está acostumado a lidar. O uso extensivo de efeitos visuais, além do trabalho com o primeiro material que não é de sua autoria.
Além disso, grande parte das críticas já estava acostumada a massacrá-lo, após o lançamento de A Vila
(2004), fazendo com que este pudesse ser seu maior fracasso crítico até agora.
E foi exatamente
o que aconteceu. Logo após o lançamento do filme, este recebeu críticas abismais, tanto do público quanto da crítica internacional, além de incontáveis pedidos para a aposentadoria do diretor.
O fato é que o jovem diretor indiano jamais conseguiu repetir seu sucesso de O Sexto Sentido (1999), embora tenha dirigido filmes da mesma qualidade, ou até melhores, como Corpo Fechado, além de Sinais e A Vila. Contudo, a partir da fantasia criada para seus filhos, A Dama na Água,
Shyamalan começou a ser bombardeado por uma multidão enfurecida de público e críticos.
O Último Mestre do Ar
é o mais recente na lista decrescente de sucesso crítico que Shyamalan dirigiu. Contudo, é, muito provavelmente, uma das maiores injustiças dos últimos anos.
De fato o filme apresenta graves problemas. Com um orçamento de 150 milhões de dólares, Shyamalan se mostrou claramente despreparado para a tarefa, a de comandar dezenas de figurantes, construir cenários gigantescos e manejar grandes quantidades de computação gráfica, em uma época em que o emprego desses elementos é muito comum na maioria das franquias norte-americanas.
Numa tentativa de adaptar a primeira temporada inteira (Livro um: Água
), composta de 20 episódios de meia hora cada, o maior problema do filme é sua duração. Com pouco mais de uma hora e meia, os acontecimentos tornam-se corridos e o espaço para explicações, limitado.
A dupla de atores masculinos, Jackson Rathbourne e Dev Patel (astro de Quem quer ser um Milionário, interpretando o antagonista, Zuko no filme), é outro ponto fraco do filme. Rathbourne sustenta o péssimo hábito de não piscar, enquanto Patel apresenta-se forçado demais no começo do filme, embora apresente considerável evolução com o decorrer da história. Ainda assim, uma decepção, já que Shyamalan era conhecido por ser um ótimo diretor de crianças, vide Hale Joel Osment em O Sexto Sentido
.
Contudo, o casal de estrelas infantis, Noah Ringer (Aang) e Nicola Peltz (Katara), sustentam seus personagens muito bem, esbanjando não só semelhança com os da série original, como simpatia e sem esforço. Notável a atuação dos adultos, Cliff Curtis e Shaun Toub, que interpretam o pai e o tio de Zuko respectivamente.
No que peca na atuação problemática e na falta de diálogos consistentes, aliados a um roteiro corrido e com poucas explicações para os desconhecidos da série, Shyamalan acerta em cheio no aspecto visual, seja na cenografia extraordinária, ou no ótimo uso da computação gráfica. A trilha sonora composta pelo seu colaborador, James Newton Howard, que compôs a música para todos os filmes do diretor, é impecável, incrivelmente bem sintonizada com os acontecimentos do filme, além de mergulhar o espectador em uma enxurrada de emoções.
O filme funciona num crescendo, terminando num final emocionante que dá gancho a uma possível (embora improvável) continuação.
É um filme de contemplação, delicado e espírita, repleto de beleza e uma fluidez, que o personagem Aang descobrirá em sua jornada, é que controla o mundo. A nossa descoberta, seja como espectador, ou como crítico, é que M. Night Shyamalan ainda é um dos diretores de maior visão e sensibilidade atualmente, e seu último filme não é exceção. Se um dia ele receberá o reconhecimento que merece, é impossível dizer. O tempo dirá.





"O Último Mestre do Ar". Título original: "The Last Airbender". Nacionalidade: EUA Diretor: M. Night Shyamalan. Roteiro de: M. Night Shyamalan - baseado na história e personagens de Michael Dante DiMartino e Bryan Konietzko. Produzido por: Frank Marshall, Sam Mercer, Scott Aversano e M.Night Shyamalan. Estrelando: Noah Ringer, Dev Patel, Nicola Peltz, Jackson Rathbourne, Shaun Toub e Cliff Curtiss. Música de: James Newton Howard. Duração: 103 min. Resenha escrita por: Roberto F. F. Causo Nota: 8,0/10

Terra dos Sonhos


Do Diretor de Batman, O Cavaleiro das Trevas, "A Origem" leva o cinema de ficção científica a um novo nível.



Após uma estréia repleta de repercussão, com Amnésia (2000), Christopher Nolan seguiu carreira meteórica, que alcançou novo patamar após a estréia de Batman Begins (2005), no qual Nolan aborda um lado sombrio e introspectivo do personagem das histórias em quadrinhos, que já havia virado filme em quatro outras ocasiões, dirigidas por Tim Burton e Joel Schumacher.
Com O Grande Truque (2006), estrelando Hugh Jackman e Christian Bale nos papéis de dois mágicos rivais, Nolan iniciou uma parceria com seu irmão, Jonathan Nolan, que continuaria na produção seguinte, Batman o cavaleiro das trevas
(2008). Com este filme, o diretor bateu inúmeros récordes de audiência e foi aclamado pela crítica e pelo público. O filme abocanhou um total de 8 indicações ao OSCAR, vencendo em duas ocasiões, incluindo de melhor ator coadjuvante postumamente para Heath Ledger, que havia morrido de overdose acidental de medicamentos prescritos, poucos meses antes do lançamento do filme.
Contudo, com A Origem (Inception
, 2010), Christopher Nolan chegou a um degrau ainda mais alto em sua carreira.
Sempre trabalhando com um elenco de grandes estrelas, o filme conta com as atuações de Leonardo DiCaprio, Ken Watanabe, Ellen Page, Joseph Gordon-Levitt, Marion Cotillard, Cillian Murphy, Tom Berenger e uma aparição muitíssimo breve do inglês Michael Cane que atua na maioria das produções do diretor. Contudo, é do elenco que vem o primeiro problema do filme.
Em A Origem,
DiCaprio é Dom Cobb, ladrão especializado em roubar idéias do subconsciente de determinados indivíduos, em uma forma altamente avançada de espionagem industrial, num futuro em que é possível acessar a mente e os sonhos de outras pessoas, representando-os fisicamente. Contudo, neste caso a missão é outra: implantar uma idéia dentro da mente do filho de um morimbundo magnata de uma grande empresa.
O primeiro problema da obra começa com a semelhança de Cobb, com outro personagem de DiCaprio, Teddy Daniels do filme Ilha do Medo
, de Martin Scorsese, lançado também este ano. À parte desta semelhança, tanto o ator principal quanto o restante do elenco apresenta boas atuações, especialmente Gordon-Levitt que brilha tanto quanto DiCaprio neste filme.
Outro problema de A Origem,
é que são raras as vezes em que o espectador realmente tem a sensação de estar dentro de um sonho, universo tão alcançável quanto misterioso, profundo e engimático dentro de nossas mentes, o lugar ainda mais desconhecido do universo. Com a profusão de perseguições, tiros, explosões, combates corpo a corpo (alguns em gravidade zero), a sensação é de estar em um filme dentro de um filme, dentro de um filme, embora tanto a construção do mundo, quanto do roteiro sejam extremamente envolventes.
Nolan brinca com as leis da física, criando corredores giratórios e cidades que dobram sobre si mesmas como folhas de papel. Em roteiro frenético, repleto de nuances e detalhes, o aspecto visual torna-se secundário na compreensão da trama, embora importante, perdendo espaço para as construções labirínticas que o diretor cria na mente de Cobb, e na nossa.
É um filme que requer extrema atenção aos detalhes, que podem criar, uma ou mais interpretações do filme, que é soberbo em criar múltiplas vertentes de explicação. Contudo, ao término do filme, o enigma apresentado torna-se um fator mais importante do que o dilema humano vivido pelos personagens, aspecto mais profundamente explorado na produção anteriora do diretor, O Cavaleiro das Trevas
.
Uma sala com infalível sistema de som e uma tela enorme é recomendável, para melhor apreciação do universo magnâmico que Nolan criou.
É correto dizer que este é um dos filmes mais complexos já filmados, com uma teia envolvente de tramas, segredos e reviravoltas em calabouços sombrios e cidades irreais construídos pela mente humana, ou do cineasta. Provavelmente será um dos grandes candidatos a ser esnobado na entrega do OSCAR do ano que vêm. Entretanto, é um filme imperdível, uma das empreitadas de ficção científica mais ousadas e inovadoras do cinema norte-americano dos últimos anos.




"A Origem". Título original: "Inception". Ano: 2010. Nacionalidade: EUA. Diretor: Christopher Nolan. Roteiro de: Christopher Nolan. Produzido por: Emma Tomas e Christopher Nolan. Estrelando: Leonardo DiCaprio, Ken Watanabe, Joseph Gordon-Levitt, Ellen Page, Tom Hardy, Cillian Murphy, Tom Berenger. Com Marion Cotillard e Michael Cane. Música de: Hans Zimmer Duração: 148 min. Resenha escrita por: Roberto F. F. Causo Nota: 9,5/10