quinta-feira, 31 de março de 2011

Não foi Dessa Vez...

Em Metro 2033 os sobreviventes de uma catástrofe nuclear vivem nos metrôs de Moscou. Pena que a história não assusta


É indiscutível que Dmitry Glukhovsky tem talento para escrever, mas me pareceu que este é um de seus primeiros livros. O livro Metro 2033 (Idem, lançado na Rússia em 2007) tem vários pontos positivos, muitos mesmo, e por isso o classifico como regular, no meu ponto de vista. Mas não posso dizer que seja mais do que isso. A história se passa 20 anos após um apocalipse nuclear, que teria ocorrido no caótico ano de 2013, e aparentemente devastou o mundo. Inúmeros russos conseguiram se proteger descendo ao subsolo, ocupando estações de metrô e seus trilhos e túneis. Os anos se passam e as estações se tornam territórios soberanos, criando alianças umas com as outras, surgindo até mesmo territórios neo-nazistas e comunistas. Tudo vai bem, mas o medo constante da radiação e dos mutantes (monstros criados a partir de pessoas e animais sobreviventes que foram transformados pelos efeitos nucleares) os impedem de sair da proteção do subterrâneo. O problema real surge quando os túneis começam a ficar infestados destes mutantes que passam a entrar no subsolo por algum lugar. É aí que a nossa história começa.

Não posso dizer que as aventuras de Artyom (que insisto em ler automaticamente com Ayrton) - personagem principal - não me divertiram e angustiaram, pois o fizeram, mas em certos momentos a história me entediou quase ao ponto de abandonar a leitura. E, infelizmente, não foi apenas uma vez. Sorte que sou determinado no quesito "terminar livros começados". Com certeza o detalhamento que o autor faz do subterrâneo é extremamente rico, com o interior das estações bem descrito e a fácil visualização dos locais (que supus seria difícil principalmente para quem não mora na Rússia), assim como a sensação de enclausuramento e claustrofobia criado por todo o subterrâneo, túneis, passagens e corredores. Mas, por outro lado, e embora eu goste imensamente de ficção apocalíptica (do contrário não compraria o livro), algumas partes caem na ridicularização pela impossibilidade da coisa, e olha que me refiro a um livro que comprei pensando falar de zumbis. O PARÁGRAFO A SEGUIR CONTÉM SPOILERS. PULE-O SE NÃO QUISER SABER!

As cenas em que a espuma tóxica radioativa ganha vida dentro de uma estação, por exemplo, e ataca as pessoas é risível, para dizer o mínimo. Enquanto lia e tentava me concentrar no perigo que os personagens viviam, era impossível não pensar no quão absurdo aquilo era e o quão ridículo soava. Sem falar que a história das estrelas do Kremlin ou do som que fazia as pessoas desmaiarem e morrerem nos túneis não têm explicação ou sentido algum, partindo até para um possível lado sobrenatural (diz-se que existem demônios nas estrelas de rubi do Kremlin e eles hipnotizam quem olhar para elas - não sei se faz parte da lenda do Kremlin mesmo, mas na história achei totalmente desconexo de todo o resto). Pô, fala sério né? Por melhor que seja a escrita em vários pontos, os pontos negativos já citados, mais as conversas pseudo-filosóficas/religiosas me irritaram imensamente. O autor parece querer inserir sempre que possível uma teoria que margeia a filosofia ou a religião e isso faz certas partes do livro parecerem auto-ajuda de quinta categoria. Uma pena, pois a história tinha tudo para ser ótima.

Soube que este livro chamado de cult (pfff, vai saber o porquê) virou um jogo com mesmo nome. Não vou opinar sobre isso visto que não joguei e nem mesmo vi o jogo, mas parece bom. Se houver oportunidade, jogarei sem dúvidas. Quanto ao motivo da nomeação como cult, acho que é devido às já citadas conversas psicológicas/religiosas/filosóficas. Acho que para algumas pessoas pode parecer de uma profundidade incomum, mas a mim não alcançou dessa forma.

Outro ponto que vale destacar, para finalizar, é que os nomes das estações são extremamente longos e confusos, embora isso não seja bem uma reclamação. Não há o que fazer a este respeito, pois é um livro russo e era o mínimo que se podia esperar. Não foi dessa vez que Glukhovsky entrou para a minha lista de autores preferidos, mas quando ele escrever outros livros, os lerei. É um autor razoável, mas que ainda não chegou lá. Mal posso esperar para quando ele chegar.

quarta-feira, 9 de março de 2011

127 Horas para o Renascimento



A diferença entre 127 Horas e o trabalho anterior de Danny Boyle, Quem Quer ser um Milionário?, é que o longa protagonizado por James Franco é um grande filme.


Se o diretor inglês Danny Boyle pisou na bola feio com Quem Quer Ser um Milionário, pelo qual ganhou o injusto reconhecimento ao fazer uma versão suja, miserável, pretenciosa e exagerada de Cidade de Deus (que aliás não venceu nenhuma de suas 4 indicações ao OSCAR, incluindo de melhor diretor), em 127 Horas (127 Hours, EUA, 2010), ele acertou na mosca.

O título auto-explicativo narra a tentativa de sobrevivência de Aaron Ralston (soberbamente interpretado por James Franco), em seu verídico acidente ao escalar uma fenda nos canyons americanos em Utah. Durante uma de suas aventuras, Aaron escorrega e seu braço direito fica preso debaixo de uma pedra de peso incalculado, levando-o a medidas desesperadas para sobreviver.

Desde o primeiro frame da empreitada de Boyle, sabemos que Aaron é um indivíduo aventureiro e naturalmente inconsequente. Ao preparar sua mala de viajens, ele esquece itens que poderiam ser fundamentais para sua sobrevivência nos cinco dias que permaneceu preso em uma fenda com uma pedra enorme prendendo seu braço. Entre eles um canivete suíço e posteriormente uma garrafa de gatorate, que viria a calhar quando a água de sua garrafa começou a se esgotar.

Para criar o ambiente claustrofóbico e introspectivo de Aaron, que gravou em sua câmera de vídeo, pensamentos que depois foram revelados aos seus parentes e amigos, Boyle abusou das características intimistas ainda mais do que quando filmou Quem Quer Ser um Milionário, pelo qual venceu o OSCAR de Melhor Filme e Diretor.

A começar pela fotografia que, em muitos momentos, utiliza ângulos próximos do rosto do protagonista e cores fortes que dão vida ao deserto de pedras americano. Algumas características da direção do inglês não são menos irritantes do que em seu trabalho anterior, como a fragmentação de imagens e a música excessivamente "hippie", e barulhenta. Mas até isso ajuda de alguma forma ao espectador entrar no consciente e no subconsciente de Aaron enquanto ele conversa com a câmera.

Após fracassadas tentativas de se desprender, Aaron começa a viajar pelos labirintos e desertos de sua mente, relembrando os momentos com sua família (com a qual ele conversa dentro da fenda), sua antiga namorada que ele visita em sonho, de duas garotas que ele encontrou no começo de sua aventura, e nos eventos que, desde seu nascimento, culminaram naquele momento.

127 Horas é uma história sobre sobrevivência. Ainda que o diretor procure fugir do ambiente claustrofóbico da caverna, a tensão vai aumentando conforme a água do reservatório de Aaron se esgota. Ainda assim, ambos, Boyle e Franco, foram capazes de aliar os momentos de tensão com humor e humanismo, característica que, embora amplamente explorada no vira-lata indiano, falhou miseravelmente e que torna-se fundamental no deserto americano.

E além da perspectiva da morte de Aaron, ou da opção que ele escolhe para salvar sua vida, o espectador se depara com um personagem incrivelmente humano e increvelmente forte (motivo, alías, para ele ter ficado preso na fenda e sem ter avisado ninguém aonde ia). E para uma angústia maior ainda, o que o espírito humano é capaz de resistir para sobreviver.

127 Horas é um filme infinitamente melhor que o trabalho vencedor de 8 OSCAR em 2008, Quem Quer Ser um Milionário, com um desempenho soberbo de James Franco, comparável ao vencedor do OSCAR de Melhor Ator, Colin Firth.

Se Aaron, em sua jornada de uma vida inteira, aguardou cada segundo, cada sopro de ar para confrontar aquela rocha no dia 26 de Abril de 2003, não foi para ele encontrar sua morte. Pois o destino de uma pessoa não pode ser medido em minutos ou horas, em eventos que duram segundos, nem nos momentos mais íntimos, secretos e felizes de sua vida. É medido pela força necessária para se sobreviver. Força que Aaron carregou consigo durante cinco dias, rumo ao seu renascimento.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Vida longa ao R...R...Rei



Se o Discurso do Rei merece alguma coisa, é o reconhecimento da capacidade de elevar o espírito do espectador. Mas não muito mais do que isso.


Já é mais ou menos de conhecimento comum que a Academia seja fã das histórias da aristocracia britânica, como já foi visto em tantos outros filmes. O que surpreende é, além da história de superação do rei George VI, a quantidade de admiração que o filme britânico causou nos votantes da entrega do OSCAR, acima de obras naturalmente americanas e não menos interessantes, como A Rede Social e Bravura Indômita.

Afinal, já faz um tempo que um filme inglês não vence o OSCAR de melhor filme. Se bem que, Quem Quer Ser um Milionário é mais inglês do que qualquer outra coisa. Mais do que indiano, com certeza. O Discurso do Rei (The King's Speech, ING/AUS/EUA, 2010) teve uma tragetória interessante para vencer 4 estatuetas, incluindo a de melhor filme.

Suas críticas, apesar de boas, foram incomparáveis às de A Rede Social, filme de David Fincher sobre a criação do facebook e suas repercussões. Na entrega dos Globos de Ouro, ele foi massacrado pelo concorrente, vencendo um prêmio contra quatro da biografia de Mark Zuckerberg.

Mas então alguma coisa aconteceu e os deuses cineastas mudaram seu foco do moderno e eletrizante filme biográfico, para o mais clássico e muito menos eletrizante, mas também biográfico, filme do rei inglês que sofria de gagueira. Estrelado por Colin Firth, este venceu todos os prêmios de melhor ator, que já eram certos desde o começo, mas do momento em que Tom Hooper, o diretor venceu o prêmio do sindicato dos diretores, a coista toda começou a crescer de forma escalonada até a entrega do OSCAR.

Passado às beiras da segunda guerra mundial em 1934, George VI, torna-se rei da inglaterra após a abdicação de seu irmão (interpretado por Guy Pierce) que insistiu até o último momento em se casar com uma mulher divorciada, o que não é permitido pela igreja. Sendo assim, o indesejado reinado caiu nas mãos de George, que sofria de gagueira ao menor sinal de desconforto ou medo.

Em uma época em que o rádio era o principal e mais influente meio de comunicação, esse era um aspecto mais do que problemático para o homem que se encontrava às portas do maior conflito bélico da história da humanidade, e sem saber como se dirigir à nação.

Sendo assim, ele e sua esposa (Helena Bonham Carter num papel muito mais interessante do que qualquer filme de Tim Burton) procuram a ajuda de um especialista pouco ortodoxo, chamado Lionel Logue (Geoffrey Rush). E assim começa um dos relacionamentos mais inusitados e divertidos da história recente. Ou não tão recente assim.

Pelo visto deu certo. A história do rei gago e entrege ao acaso, venceu 4 OSCAR, sendo eles melhor filme, diretor, ator e roteiro original, o que em parte foi uma surpresa, já que na categoria de melhor direção, David Fincher era o favorito por quilômetros.

E de fato O Discurso do Rei é um filme muito bom. Seus diálogos e situações são divertidíssimos e o filme é uma dramédia inteligente que eleva o espírito do espectador. Aliando elementos como figurino e trilha sonora que contrapoem um ambiente opressor criado pela direção de arte e uma fotografia intimista que abusa de ângulos pouco comuns, o filme é, no conjunto da obra, uma experiência cinematográfica mais do que satisfatória.

Pena que não era para tanto.

Dentre 10 indicados ao prêmio de melhor filme, vários dos favoritos eram filmes biográficos. 127 Horas, O Discurso do Rei, O Vencedor e A Rede Social. É menos é claro que se você teve bonecos que ganharam vida, Toy Story é um filme sobre sua vida. Isso mostra que 2011 foi um ano com uma concentração maior de histórias verídicas, sobrepujando as ficcionais, como A Origem. É uma pena que dentre a história do rei gago, do lutador caído, do alpinista preso e do fundador do facebook, O Discurso do Rei, apesar de bom, não tenha sido o melhor de todos, perpetuando a fama de Academia de reacionária e ultrapassada.