sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Belo e Vazio




As Aventuras de Tintim traz Steven Spielberg ao reino das animações, na tentativa de recriar os quadrinhos de Hegé, captando a beleza, mas se esquecendo da alma.




Um novo movimento tem ocorrido nos últimos anos (e especialmente ano passado) no cinema contemporâneo norte-americano. De novo na verdade ele não tem nada, diretores japoneses já vem fazendo isso há muitos anos, mas certamente o fenômeno vem chamando atenção.

Trata-se de diretores especializados em animações estão mudando suas atenções para os longa-metragens com atores e cenários de verdade. Mas se por um lado, os diretores Brad Bird e Andrew Stanton - ambos da Pixar - dirigiram Missão Impossível: Protocolo Fantasma e John Carter (estréia em Março), em contrapartida nomes como Gore Verbinski e Steven Spielberg se aventuraram nos oceanos da imaginação com Rango e mais recentemente, As Aventuras de Tintim (The Adventures of Tintim, EUA/NZL, 2011), em cartaz no Brasil.

Dirigido por um dos nomes mais concentuados do cinema internacional, e protuzido por Peter Jackson (diretor de O Senhor dos Anéis) o filme foi produzido utilizando a tecnologia da captura de movimentos, que cria animações em três dimensões que copiam fielmente os movimentos físicos e faciais dos atores.

Mais do que a busca por uma nova tecnologia, a epopéia de Spielberg é algo que faz mas sentido - e mais seguro - do que as empreitadas de diretores como Bird e Stanton. Deve-se ao fato de uma simples questão psicológica, onde o espectador acredita fielmente que tudo o que está presente nas telas de um desenho animado é plausível e verossímil, o que não acontece em longas com atores reais, onde a inverossimilhança excessiva (como no caso de Missão Impossível), deixa de cumprir seu papel como catalizador da diversão e passa a ser ridícula.

Ambos utilizam recursos de suas obras originais, no entanto. Bird usou e abusou da computação gráfica para narrar as aventuras de Ethan Hunt, enquanto Spielberg utilizou de técnicas puramente cinematográficas como posicionamento de câmera, edição e iluminação, para criar uma animação que parece com um filme de verdade.

Baseado nos quadrinhos do belga Hergé no final da década de 20, Tintim era um jovem jornalista e viajante auxiliado pelo seu fiel escudeiro, o cachorrinho Milu. A série tornou-se muito famosa especialmente na europa e já rendeu dezenas de títulos em quadrinhos e até uma série animada que chegou a passar no Brasil.

"O Segredo do Unicórnio" é baseado em O Tesouro de Rackman, o terrível de 1944 que procura explicar a origem da amizade do protagonista com outro de seus amigos, o famoso capitão Haddock e sua busca pelo navio de batalha, Unicórnio, uma embarcação do século XVII que desapareceu junto com um segredo.

As interpretações ficaram a cabo de um elenco internacional. Jamie Bell tomou as rédeas do protagonista Tintim, enquanto o capitão Haddock ficou nas mãos do maravilhoso Andy Serkins. O vilão, Sakharine é interpretado por Daniel Craig. O filme ainda conta com as vozes de Toby Jones, Simon Pegg e outros, dando uma qualidade fora do normal em termos de caracterização de personagens que por sinal estão igualzinhos às obras originais.

Os efeitos especiais são sensacionais, os cenários parecem de verdade e o visual é um dos mais belos da história recente. A montagem é de Michael Kahn, sempre em parceria com o diretor, e o diretor de fotografia Janusz Kaminski serviu como consultor técnico para a Weta Designs (produtora de efeitos especiais do filme), que tem uma qualidade pictórica impressionante, assemelhando-se aos estilos noir que fizeram tanto sucesso nas décadas de 20 e 30, enquanto a trilha sonora é composta pelo parceiro de longa data de Spielberg, John Williams.

E apesar de seus efeitos especiais extraordinários, um roteiro divertido e imaginativo, uma direção ágil e a melhor equipe técnica que o dinheiro pode comprar, As Aventuras de Tintim não possui um pingo de alma em todos os seus 107 minutos de duração. É vazio, e suas concepções parecem mais arqueteturais do que emocionais.

Isso em parte é decorrência da trilha sonora de John Williams, que - por incrível que pareça - em suas duas últimas colaborações com Spielberg, pareceu ultrapassar o ponto de frenagem em uns vinte quilômetros. Se em O Cavalo de Guerra (também em cartaz no Brasil) ele pecou pelo excesso, em Tintim ele compôs uma música absolutamente sem personalidade ou imaginação. Seu estilo fragmentado não ajuda a criar um tema bem definido e principalmente a proporcionar ao filme o que lhe faltou: alma.

Era de se esperar. E infelizmente, apesar de todos os elementos conspirarem para um bom resultado, ele fica aquém do que qualquer fã dos quadrinhos de Hergé desejariam: uma obra que, em detrimento das qualidades técnicas, possuia o que ironicamente a obra original e a última produção do diretor, O Cavalo de Guerra possuíam: alma.

Nenhum comentário:

Postar um comentário