domingo, 31 de julho de 2011

Não é justo



Harry Potter e as Relíquias da Morte, pt II, releva uma questão curiosa: 'quando um filme baseado em um livro, consegue ser melhor que o próprio livro'?




É inegável que a saga criada por J.K. Rowling foi um dos maiores fenômenos culturais/literários de todos os tempos. Milhões, senão bilhões, de pessoas se emocionaram e acompanharam com aptidão e interesse incríveis, as aventuras e confusões do bruxinho Harry Potter e seus fiéis amigos, Rony e Hermione.
Com um total de sete livros e oito filmes (o último foi dividido em duas partes), é também de conhecimento comum, que esta foi uma das franquias mais rentáveis da história contemporânea, tanto na literatura quanto no cinema. É com esse pedigree, que o último filme - ou seja, a última apresentação - da saga de maior sucesso de todos os tempos, Harry Potter e as Relíquias da Morte parte II (Harry Potter and the deathly hollows part II, EUA, 2011), estreou como se esperava que deveria estrear: como um meteoro.
Em menos de dezenove dias, o último filme da série arrecadou 900 milhões de dólares, batendo o recorde que anteriormente era de Avatar , de James Cameron. Este, além de proporcionar aos fãs e espectadores em geral o épico final escrito por Rowling, é também uma das mais curiosas das produções.
Pra começar, é o final, obviamente. Em segundo lugar, o diretor, David Yates, é o único a dirigir mais de duas produções da franquia Harry Potter. Chris Columbus dirigiu os dois primeiros e Yates os quatro últimos, como se os produtores estivessem, durante os episódios três e quatro, testando novos diretores, até que este foi escalado para comandar A Ordem da Fênix.
Curioso também, pois analisando-se a diretor e seus trabalhos anteriores, nota-se um desnível de qualidade cinematográfica. Da bomba cataclísmica que foi o quinto episódio, para o sensacional sexto filme, o monótona mas não menos divertida primeira parte do último, para então a complicada segunda parte.
Seria impossível analisar completamente esta produção, sem compará-la com todas as outras, e por falta do conjunto espaço/tempo, isso não será possível. Mas existem pontos que valem a pena serem ressaltados.
A começar pelo elenco. Durante os últimos anos, a saga Harry Potter, tornou-se conhecida por contar com um dos mais espetaculares elencos de qualquer filme Hollywoodiano. Com os atores do maior calibre do Reino Unido, o que criou um problema inusitado. Isso acontece pois o elenco é dividido em duas metades muito distintas: os adultos que ganharam os papéis coadjuvantes como os professores, vilões, aliados e enfim, e as crianças que obtiveram os papéis principais.
Ainda que os jovens Rupert Grint (Rony) e Emma Watson (Hermione) tenham melhorado suas técnicas dramáticas, tanto eles quanto o péssimo Daniel Radcliffe no papel de Harry Potter, ficam apagados diante da sombra de atores como Alan Rickman, Michael Gambon, Ralph Fiennes, David Twelis, Jason Isaacs, Brandon Gleeson, Kenneth Branagh, Maggie Smith, Helena Bohman Carter, e lá vai fumaça.
Dessa forma, o espectador sente-se irritado com as péssimas atuações dos garotos, e conta os minutos para ver os adultos em ação.
Outro dos grandes problemas enfrentados pela série, foi a mudança do compositor das trilhas sonoras. John Williams, conhecido por ser recordista de indicações ao OSCAR e por criar temas incrivelmente memóraveis (Star Wars, Jurassic Park, E.T. e Indiana Jones, por exemplo), escreveu as músicas dos primeiros três filmes apenas. E embora seu último substituto, Alexandre Desplat seja um músico de grande calibre, sua melodia não se compara a das primeiras aventuras do bruxinho Harry.
Neste filme, o brilho é quase todo de Alan Rickman. Após ganhar o papel de Severo Snape que previamente era de Tim Roth, ele deitou e rolou nos últimos dez anos, interpretando o professor que todos temem ter. E neste último empreendimento, seus dotes Shakesperianos são levados a um novo nível. E como se ele já não fosse uma das melhores coisas de todos os filmes, neste ele pega-o, dobra-o, coloca-o no bolso, e o leva embora.
Ainda assim, seus companheiros de cena Maggie Smith (profª McGonagal) e Ralph Fiennes que se entregou de forma assustadora a um dos personagens mais malígnos de todos os tempos, Lord Voldemort, tiveram apresentações memoráveis.
Os efeitos especiais também alcançaram um novo patamar. Nesta história, Harry, Rony e Hermione voltam para Hogwarts com o objetivo de encontrar e destruir as últimas Relíquias da Morte, o que inevitavelmente culmina numa batalha de proporções bíblicas, dentro do portão da escola, gerando assim, incríveis cenas de ação, e momentos de pura poesia visual.
Com apenas 130 minutos, este é um dos menores filmes da série, mas pela imensa quantidade de explosões, luzes e barulhos, não parece assim. Harry Potter e as Relíquias da Morte, pt II, é uma experiência quase exaustiva, ainda que com momentos de humor bem colocados.
O que diabos deu errado então? Essa é uma pergunta que muitos - até mesmo os que se emocionaram com a atuação de Alan Rickman, e com as últimas cenas do filme - devem ter feito a si mesmos.
Pela primeira vez em muito tempo, um filme baseado em um livro foi melhor do que o próprio livro. Isso por que na sétima obra, a autora J.K. Rowling pareceu perder completamente sua linha de raciocínio e escreveu quase 700 páginas do que foi um dos piores - senão o pior - livros da série.
O final apático e raso, deixou muitos com o coração partido. Mas o problema se estende a cavernas e calabouços mais profundos dentro da mente da autora. E que são difíceis de explicar, sem dirigirem-se à mais brutal franqueza.
O maior problema da série Harry Potter, é o próprio Harry Potter. Com um personagem fraco, infantil, pouco inteligente e dependente de todos os outros personagens, fica difícil torcer por ele, ainda mais quando todos os outros personagens que nós verdadeiramente amamos, perdem suas vidas para salvá-lo.
Harry lembra em muitos aspectos, o personagem Shinji, do anime Evangelion. Rapaz mirrado, inseguro e deprimido que é colocado em situações extraordinárias, Shinji em muitos momentos tem crises de consciência em momentos de brutal importância, que fazem o espectador querer entrar na televisão e lhe dar um chute na cabeça.
Com o jovem Harry não é diferente. Muitas das situações de vários dos livros, só acontecem devido a sua incompetência ou falta de raciocínio lógico - como *spoilers* a morte de seu padrinho Sirius Black no quinto livro, que só ocorreu por causa dele *spoilers*.
A condescendência da autora com sua criação favorita também é outro problema, pois ele não consegue fazer praticamente nada, sem a ajuda de seus amigos e professores. Ou pior: da incompetência dos próprios vilões. Isso claramente faz com que a autora fielmente confie na burrice do leitor/espectador, o que é uma tremanda sacanagem.
E consequentemente ela trai a memória do próprio personagem que ela criou, e que ela amou durante todos esses anos. Conforme os muros de Hogwarts caem, consumidos pelas explosões e inimigas e os personagens tão amados perecem diante de seus adversários, a sensação que o leitor ou espectador tem, é que eles morreram em nome de alguém que não merecia. E que nós, leitores e espectadores que tanto nos emocionamos, rimos, choramos e nos angústiamos à espera da épica conclusão da saga, merecíamos coisa melhor.


Um comentário:

  1. Ainda não assisti ao filme, e sendo bem sincero, não pretendo assistir no cinema. Pretendo baixar de algum canto da Internet uma versão decente, não gravada no cinema (sou malvado mas nem tanto).
    Dizerem-me que o filme foi melhor que o livro não é grande coisa, pois achei o livro uma merda cataclísmica, o que me fez desgostar da série inteira por seu final ridículo, patético e desconexo com relação ao resto da obra. Mas pela descrição do meu caro amigo Roberto, parece que a qualidade do filme em relação ao livro é muito maior do que se esperava, então aguardo para conferir.
    De fato, o elenco tem muitos problemas (nessa frase, elenco = criancinhas que interpretam) e entristece-me ver grandes nomes do cinema fazendo papéis secundários, aparecendo vez ou outra, enquanto os maus atores deitam e rolam em frente às câmeras (que ninguém venha me dizer que Daniel Radcliffe é um bom ator, pois vou, como o próprio Roberto disse, mas num outro contexto, dar um chute na cabeça. Não sou um expert em interpretação, mas pelo fato de ter visto teatro durante minha vida inteira [não é exagero], digo com segurança: ele é uma merda de ator).
    Com essa resenha, fico ansioso em ver o quão bom é o filme, já que ao que parece, será muito melhor do que eu imaginei. Parabéns pelo resenha Roberto (ou por aqui posso te tratar simplesmente como "Betão"? Enfim...), e espero que esse seja o primeiro de muitos comentários nesse blog, tanto à você quanto a seu colega, Guilherme.

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