domingo, 8 de maio de 2011

Onde foi parar a magia?



A Lenda, de Ridley Scott, é uma das empreitadas cinematográficas de fantasia, mais inusitadas e interessantes de Hollywood.


A Lenda (Legend, EUA, 1985), é um dos primeiros filmes de Ridley Scott, conhecido posteriormente por filmes como Gladiador, Hannibal e Falcão Negro em Perigo. Entretanto, durante o final da década de 70, e meados de 80, Scott se destacou como um dos principais diretores dos gêneros de ficção e fantasia.

Vê-se o talento do cineasta para lidar com a fantasia e o horror, em Alien - O Oitavo Passageiro (1979), Blade Runner - O Caçador de Andróides (1982) e é claro, A Lenda (1985). Isso até ele mergulhar de cabeça no besteirol, e não mais se destacar como um dos diretores mais versáteis de sua geração - vide Robin Hood (2010).

Mas naquela época, há muito, muito tempo, em um reino muito, muito distante, o inglês parecia realmente saber o que estava fazendo. Nessa estranha fantasia, Lili é uma jovem princesa interpretada por Mia Sara, que está loucamente apaixonada por um rapaz que vive na floresta, chamado Jack, interpretado por ninguém menos do que Tom Cruise no começinho da carreira. Ingênuos e imaturos como são, Jack leva Lili para ver unicórnios, as criaturas mais sagradas e belas do mundo. E no processo, a princesa toca um deles, o que é proibido.

Até aqui, tudo parece um desenho da Disney, só que interpretado por pessoas de verdade. E parece MESMO. Os diálogos são hiperbólicos e rimados, e beiram o ridículo. O filme é meigo, e fofo, quase bobo. Isso, é claro, depois que se passam os primeiros quinze minutos.

No momento em que Lili toca o unicórnio, o mundo se transforma em trevas e inverno. Todas as plantas, animais e pessoas - mortais - viram estátuas congeladas em um sono profundo. O mundo se torna um grande pesadelo, dando lugar a figuras assustadoras e demoníacas. Lili se culpa pelo que aconteceu, mas tudo não passou de um plano da Escuridão (interpretado por Tim Curry, numa das personificações do Demônio mais assustadores de todos os tempos), para transformar tudo em noite, e caberá a Jack colocar tudo em ordem novamente. Para tanto, ele se une a um grupo estranho de personagens, que vão de doendes a fadas, e juntos eles partem numa jornada para derrotar resgatar a princesa Lili da Escuridão, e assim salvar seu mundo do interminável inverno.

A Lenda, beira a subversão. O diretor Ridley Scott foi sábio o bastante para manter o tom próximo do humor, para não assustar as crianças com as vizões das horrendas - e espetaculares - criaturas que preenchem a noite. A música de Jerry Goldsmith (que só foi ouvida nos DVD's recentemente lançados, já que o estúdio vetou a trilha sonora que foi substituida pelo grupo Tangerine Dream na década de 80), sustenta o clima tenebroso, especialmente na viagem do grupo de heróis rumo ao inferno.

A obra que não teme usar e abusar das cenas de violência e da fotografia sombria, lembra os tempos em que Hollywood ousava criar histórias plenamente fantásticas - antes do cinema cair na contemporâneidade, assim acabando com muito da magia que outrora existia. Foram poucos os filmes que ousaram permanecer extritamente no universo fantástico. Como a trilogia O Senhor dos Anéis, entre outros. O visual soberbo, é precursor dos filmes de Guilhermo Del Toro, como O Labirinto do Fauno e Hellboy.

A Lenda é um filme estranho, que deve ser assistido de mente aberta. Para os curiosos, vale a pena conferir a performance de um jovem Tom Cruise, praticamente o filme todo com as pernas de fora. Ou simplesmente pelo espetacular visual, que inclui um número musical com uma bailarina sem rosto.

Mas no fim, o que o filme tenta mostrar, é que a magia é um reino que existe dentro do coração de cada pessoa. Durante nossa viagem rumo ao amadurecimento, essa magia se perde, e o caminho para os reinos de Nárnia, da Terra Média, ou de Hogwarts, torna-se cada vez mais oblíquo e nebuloso. Quando tudo o que basta, é abrir a porta.

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