quarta-feira, 20 de abril de 2011

A Redenção


Todo mundo já viu aquelas histórias clichês em que alguém chega para um padre, em confissão, e diz que cometeu um crime e aí o religioso não pode contar a ninguém e blá blá blá. Bom, apesar de o roteiro ser ligeiramente clichê, é a linha condutora da nova websérie chamada The Confession, estrelada pelo ótimo Kiefer Sutherland e pelo excepcional John Hurt. No primeiro trabalho após a finalização do mega-sucesso 24 Horas (24 no original em inglês), Sutherland surpreende ao encarnar um personagem tão parecido com o idolatrado e super-mega-blaster-foda (com o perdão da palavra, mas no melhor sentido) Jack Bauer e, ao mesmo tempo, um personagem que diverge totalmente do agente que salvou os Estados Unidos dos mais diversos atentados durante oito temporadas.

A série que terá no total 10 episódios (cinco dos quais serão comentados nesta mesma resenha e os outros cinco em uma próxima), de pouco mais de cinco minutos cada, foi filmada em Nova York durante nove dias. A história gira me torno de um assassino profissional (Kiefer Sutherland) que entra em uma igreja na véspera de natal e vai se confessar com um padre (John Hurt). Ele conta ao padre que matou um homem na noite anterior e que pretende matar outro naquela mesma noite. A partir de então começa uma discussão sobre filosofia e teologia em que o espectador percebe que nem o assassino é completamente mau e nem o padre, completamente bom. Ambos os personagens se mostram mais profundos do que o esperado ao se enveredarem por discussões sobre o bem e o mal, sobre o homem e Deus e sobre a violência do ser humano, tudo em um clima de ameaça sob a mira com silenciador de Sutherland no pequeno confessionário. Brad Mirman, que dirigiu e escreveu o roteiro para a série, ainda se utiliza de flashbacks para mostrar o passado e algumas experiências do assassino.

E aí curtiu? Bom, colocarei ao final desta resenha o trailer da série para que vocês mesmos julguem se é tão boa quanto parece ou não. Mas a partir de agora farei um curto comentário dos primeiros 5 capítulos e é bem provável que haja SPOILER a partir do próximo parágrafo. Se você não liga, vá em frente, mas considere-se avisado; se liga, pule para o parágrafo final e para o trailer do final do post e peça um link para download nos cometários, se quiser, que eu indico o site onde encontrei.

A série se inicia com uma comparação clara entre os dois personagens principais: o assassino e o padre. À medida que uma música instrumental incita o mistério e o suspense, vemos ambos os homens se vestindo para o dia que têm pela frente. Um deles, vestindo seu colete à prova de balas, enquanto o outro veste a batina negra com a faixa púrpura; um deles veste luvas de couro negro enquanto o outro veste o colarinho branco que caracteriza o clero; um deles prepara sua pistola com silenciador enquanto o outro pega seu terço e sua bíblia. E assim começa essa obra de arte, que infelizmente não dura tanto quanto eu gostaria. Logo vemos que nenhum dos dois personagens têm nome: ambos são caracterizados por suas respectivas profissões. O que fazem define suas vidas. No decorrer dos primeiros episódios, vemos o matador ameaçar fiéis que vão à igreja apenas para que o padre se sente com ele e discuta pacificamente. Em nenhum momento impõe seu ponto de vista, estando sempre aberto à discussão sobre fé e entrando em temas como livre-arbítrio (usando bandidos e assassinos como exemplo), perdão sincero de seus pecados e o fato de o ser humano ter ou não escolha quanto a seus atos. Um detalhe que chama a atenção é que, apesar de o assassino mater uma arma sempre à mão, em toda a história há um clima de igualdade entre o homem e seu confessor. Da mesma forma que o padre defende a opinião e os ensinamentos de Deus, vemos o outro debatendo e rebatendo cada argumento com outros igualmente fortes. O clima de "cabo-de-guerra" é leve e pacífico, apesar da situação dentro do confessionário. É quase como os típicos oponentes que são rivais, mas se gostam. Voltando à história, é muito legal a parte em que o padre é obrigado a mostrar que também é humano quando é forçado a assumir que já achou que pessoas mereceram morrer. Pessoas que, ele admite, viu machucarem outras pessoas. Notamos então que a imagem que temos do clero em geral é ilusória. Mesmo os mais puros e aparentemente santos dos religiosos não deixam de ser apenas humanos. Isso fica claro e exposto à meia-luz que adentra a igreja pelos vitrais coloridos em direção ao confessionário. Por fim, discutem entre si o poder. O fato de um deles assustar as pessoas, o fato de aquela arma simbolizar um poder inexistente sem ela, o fato de aquele simples objeto tornar um ser invisível em alguém a se temer. Da mesma forma, descobrimos as dúvidas de um homem que dedicou sua vida a um Ser superior, mas que nunca abandonou sua posição pelo significado que o colarinho branco lhe confere.


De todas as discussões, debates e exposições filosóficas e teológicas que podemos ver entre o matador e o religioso, nem todas incluem Deus. Eu tenho por regra pessoal jamais discutir sobre religião, sejam as minhas crenças ou as dos demais, mas tais crenças não influem de forma alguma no entendimento e interiorização das conversas e discussões da série. Independente do que você acredita, The Confession é brilhante. Seja pelo tema, pelas diversas discussões e abrangências que dele derivam ou simplesmente pela atuação dessas duas feras que protagonizam esta websérie. Acho que vale acompanhar para saber em torno de qual redenção a série gira: a do padre ou a do pecador?


"Padre: -Tirar vida não é decisão do homem.

Assassino: -Então Deus é o único que pode tomar essa decisão?

P: -Sim.

A: -Ele pode me impedir a hora que quiser."











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