sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Coronel Jason Nascimento do Bourne





Filme de José Padilha, Tropa de Elite 2 aborda um lado diferente de seu predecessor. A corrupção.

Desde o sucesso internacional da grande produção de Fernando Meirelles, Cidade de Deus, a chamada Cosmética da Fome vem sendo abundantemente explorada no cinema brasileiro. A Cosmética da Fome retrata basicamente a violência, o sexo e o tráfico, tendo como palco na maioria das ocasiões, as favelas brasileiras, em especial, do Rio de Janeiro.
A primeira escurssão de José Padilha no que parece ter se tornado uma nova franquia do cinema brasileiro, Tropa de Elite (2007), não é exceção. Na trama, o capitão Nascimento precisa encontrar um substituto para sua ocupação, enquanto tenta enfrentar o tráfico nas favelas do Rio de Janeiro antes da chegada do Papa em 1997.
Com grandes quantidades de sequências de ação, tiroteios e fortes cenas de violência, o filme imediatamente caiu no gosto popular e logo obteve atenção internacional, vencendo a Palma de Ouro em Berlin. Mas além disso, apresentou ao público brasileiro um personagem de magnitude nunca antes vista em produções nacionais. O capitão Nascimento. Um homem direto, de moralidade duvidosa, contudo incorruptível, que fará de tudo o que estiver ao seu alcance para por um fim ao tráfico e à marginalidade nas favelas cariocas. Mesmo que isso signifique tortura e outros atos ilegais.
Já em Tropa de Elite 2 - agora o inimigo é outro (BRA/2010) que estreou de maneira explosiva no circuito nacional, o foco da narrativa do capitão Nascimento (agora Coronel), é outro. Após uma operação que dá errado, durante uma invasão a um presídio de segurança máxima, Nascimento, ao invés de ser deposto de seu cargo, é promovido a um na Secretaria de Segurança. Uma atitude que, embora contrária às intenções do governador, serviu como um ato político, dado que Nascimento caiu no gosto popular após o massacre que ocorreu no presídio quatro anos antes do começo da narrativa principal.
Lá, ele procura outras formas de deter o tráfico e criminialidade nas favelas, introduzindo novos armamentos e aumentando o número de tropas do comando especial BOPE. De certa forma, a atitude agressiva de Nascimento com relação à marginalidade carioca funciona, na medida que ele põe um fim aos chefões do tráfico. Entretanto, dessa forma, cria o estopim para uma nova forma de criminalidade: a formação de milícias através da corrupção policial.
Diante disso, Nascimento descobre que seu verdadeiro inimigo é justamente aqueles com quem ele trabalhou durante todo aquele tempo, seus colegas de escritório e os políticos que utilizam como moeda corrente, os votos durante uma época de eleições.
Com o "apoio" do deputado Fraga, que é casado com sua ex-esposa, Nascimento tentará espor a corrupção policial, relacionada à formação de milícias, sequestros, assassinatos e manipulações eleitorais, tentando criar um balanço entre seu trabalho e sua vida familiar conturbada, especialmente com o filho, Rafael.
Nesse aspecto, as profundidades do personagem interpretado por Wagner Moura aparecem com maior intensidade. Nascimento é um homem que só consegue viver para o trabalho, o que explica a falha miserável em seu casamento, a péssima relação com o marido de sua ex-esposa (do qual ele necessita de ajuda) e uma ainda pior com seu filho, sem saber que, ao bater de frente com o sistema, ele estará envolvendo sua família em uma onda de violência sem limites.
O roteiro de José Padilha e Bráulio Mantovani é interessante. A narrativa começa com Nascimento sofrendo um atentado. Seu carro é transformado em uma peneira por um batalhão de policiais corruptos enquanto ele saía de um hospital. Conforme o filme prossegue, o protagonista narra de uma forma muito bem feita os acontecimentos que o levarão até aquela situação. A operação no presídio de segurança máxima, quatro anos antes, seu desentendimento com o colega André Matias (interpretado pro André Ramiro), sua promossão e posteriora guerra contra o sistema que ele tanto jurou defender.
Contudo, o roteiro, ao tentar ser inteligente, esbarra em problemas nos quais depende da burrice ou incompetência de seus personagens (em especial os da imprensa carioca), para manter o suspense e as constantes reviravoltas da trama. Desde a primeira fala, o filme procura ironizar as produções de ação norte-americanas, mas acaba caindo em fórmulas hollywoodianas já vistas antes, como as de Jason Bourne, por exemplo. Um homem procurando enfrentar o sistema sozinho e na obscuridade, também sendo um grande especialista em combates físicos e uso de armas (o que diante de sua profissão é compreensível, mas qualidade que é explorada ao extremo). A narrativa rápida e a edição fragmentada, além do suspense político e até mesmo a trilha sonora são elementos típicos da trilogia protagonizada por Matt Damon, ainda que com grandes alterações.
Da mesma forma em que procura ser inteligente, o filme acaba tendo visões otimistas que se tornam um tanto "inoscentes" diante do contexto político-social mais do que conhecido pela sociedade brasileira, assim como uma visão um tanto ingênua da imprensa e de sua capacidade (ou incapacidade) de provocar alterações significativas na política brasileira.
Onde abundam defeitos, abundam qualidades. Os diálogos são bons, assim como os desempenhos dos atores principais (especialmente de Wagner Moura que carrega o filme). A fotografia é detalhada ajudando a acentuar as cenas de ação, os diálogos são bons e há uma exploração maior das tramas polícias e dramas pessoais que Nascimento terá que enfrentar.
O clima de Tropa de Elite 2 difere muito de seu predecessor. O filme possui menos cenas de ação e se concentra mais em desenvolver os diferentes aspectos da corrupção, recheados de diálogos interessantes (embora com um uso excessivo de linguagem chula, embora isso não atrapalhe) e os dramas pessoais de Nascimento com sua família. Na relação com seu filho, esbanja ternura, enquanto o personagem que se tornou famoso por todo o Brasil procura lidar com seus próprios dilemas morais e éticos, que ele nunca havia prestado atenção.
Ainda assim, o mercado audiovisual brasileiro é restrito. A maior parte dos filmes que geram grande bilheteria e conseguem o mínimo de reconhecimento internacional, não fogem à fórmula da Cosmética da Fome, que já abordada e desenvolvida tantas vezes, com óbvias excessões. Filmes como Nosso Lar e O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias são um caso à parte, demonstrando versatilidade e qualidade no cinema nacional (sem qualquer mensão ao filme Lula-Filho do Brasil, um caso grave de propaganda política de mal gosto).
Contudo, o cinema nacional enfrenta problemas e mesmo com a lei que obriga 30% da grade de programação do cinema conter obras brasileiras, o mercado ainda é pequeno. Faltam produções inteligentes com enfoque maior à rica cultura e história brasileiras. A concorrência com os filmes estrangeiros, que esbanjam efeitos visuais e atores de rostos conhecidos em diálogos cretinos e humor pastelão é esmagadora. Entretanto, 2010 surgiu com produções como Nosso Lar e Tropa de Elite 2, sendo que este útlimo, apesar de não fugir de certas fórmulas, certamente representa uma grande evolução no cinema nacional.

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